quinta-feira, julho 31, 2014

Grande Muralha da China

Uma vez que se está em Pequim, é boa ideia dar um pulo até uma das obras do homem mais admirada por todos. A capital de Pequim é um excelente ponto de partida para visitar um dos muitos troços deste símbolo que já não é só da China. Apesar de ser duvidoso que a Grande Muralha da China possa ser avistada do espaço, é um grande momento nas nossas vidas que a possamos avistar aqui mesmo da terra.

A sua construção teve início há mais de 2000 anos, século III a.C., acreditando-se que terá coincidido com a dinastia Qin, pelo mesmo imperador que mandou construir o exército de terracota de Xi'an e então unificou o país. Os propósitos eram defensivos, procurando proteger o que então era designado China Proper das invasões dos povos do norte e nordeste, ascendentes dos povos conhecidos hoje como mongóis e manchus.

A sua estrutura não é contínua, antes é composta por vários troços, uns que já não existem, outros preservados até aos nossos dias, outros ainda em reconstrução. Ainda assim, são cerca de 8851 km de muralha entre a fronteira com a Coreia do Norte e a província do Xinjiang, os quais foram ganhando vida e crescendo ao longo das diversas dinastias.

No entanto, e talvez pela sua descontinuidade, a Grande Muralha não foi muita efectiva em impedir os povos do norte de invadirem a China - a prová-lo está o facto de várias terem sido as dinastias estrangeiras a governarem o país depois da sua construção, de que são alguns exemplos os Jin, os Mongóis e os Manchus.

Mas se não foi decisiva na protecção dos inimigos, a Grande Muralha teve uma função igualmente importante, uma vez que acabou por servir de rota para transporte de pessoas e bens. Lembrar que troços da muralha podem ser encontrados em lugares bastante inóspitos e ainda hoje de não muito fácil acesso.

Dando início ao relato da nossa experiência, dizer que o restauro da Grande Muralha tem sido uma empresa levada a cabo com alguma intensidade ao longo das últimas décadas e que é precisamente junto a Pequim que encontramos os troços mais bem restaurados. Mas talvez não muito respeitadores da autenticidade do original.

Posto isto, há que escolher qual o troço a visitar. Mutianyu, Badaling, Jiankou, Huanghua Cheng, Zhuangdaokou, Simatai, Jinshanling são alguns nomes a ter em conta. No nosso caso, como queríamos conciliar o dia de visita à Grande Muralha com uma ida até aos Túmulos Ming, a melhor opção era Badaling. O mais acessível e o mais concorrido. E para fazer tudo num dia não restava outra hipótese senão aderir a uma excursão.

Neste ponto há que abrir um parêntesis para dizer que detestamos excursões.


Indo directamente ao fundo da questão, dizer que os Túmulos Ming - que me seduziram à partida por nunca ter esquecido os túmulos dos imperadores vietnamitas, que possuem influência da China - não valem o sacrifício de entrar numa excursão. Ok, o sítio onde estão implantados é belo, no meio das montanhas, mas são estruturas muito maçudas, cuja visita não me acrescentou muito quer em termos históricos quer estéticos. Claro que só digo isso por ter ido numa excursão. Isto porque tivemos neste dia a pior refeição da semana numa daquelas mega lojas que as empresas de viagem concertam com os comerciantes em parar os turistas. Esta era de jade e ao fim do dia ainda nos esperava uma de seda. Bom para quem quer comprar ou tenha interesse nesses itens, no meu caso a fase dos bichinhos da seda já passou.

Durante o almoço de treta já estávamos a ver que a visita em carneirada à Grande Muralha iria ser apressada. Quando chegámos a Badaling a guia Jenny (ainda não consegui entender porque é que os chineses adoptam sempre nomes estrangeiros - e fazem questão que nós adoptemos um nome chinês wo xing shen de shan) começou logo a dizer que teríamos apenas duas horas no local e que por isso era bom apanharmos o teleférico em vez de tentarmos subir por nós, porque se não não tínhamos tempo para ir e vir, e que nos íamos perder, e que o espírito do Gengis Khan andava à solta. Não, esta ela não se lembrou de inventar.

O certo é que muito contrariadas (nós e um casal inglês) lá fomos no teleférico - toma lá 20 euros para cada. Do nosso grupo de 18 indivíduos, só 3 tiveram o discernimento de não o fazer, constatámos depois - precisamente dois irmãos ingleses, um deles casado com uma chinesa.

A jornada de teleférico conta-se de uma penada: quase meia hora na bicha, pouco mais de cinco minutos, com muitas paragens no ar não sei para quê, para subir os quase 200 metros. Fantástico. Mesmo assim, ainda tínhamos cerca de 1 hora e meia para caminhar pela Grande Muralha, o grande objectivo do dia.




O troço visitado está completamente renovado desde os anos 80. A paisagem é soberbamente infinita. Caminhamos desde a saída do teleférico para cima, a brincar de nos escondermos nas ameias e nas muralhas. O ambiente que se vive é de contentamento e até euforia por estar num dos maiores símbolos da humanidade.

Este pequeno troço não tinha saída, pelo que rapidamente voltámos para trás e se colocou um dilema: aceitar o que a Jenny havia dito, para voltarmos da mesma forma (de teleférico) e não começarmos a caminhar à toa para baixo porque era difícil, demorado e íamo-nos perder - até contou histórias de desaparecidos e mortes (a sério, enquanto me lembrar disto tão cedo não volto a meter-me numa excursão); ou arriscarmo-nos a descer pela muralha, afinal de contas não havíamos subido assim tanto no teleférico e o percurso não poderia demorar muito. Depois de muita indecisão decidimo-nos por esta última, não podia ser de outra forma. Resultado: chegámos cá abaixo ao local de encontro rapidamente em primeiro lugar e ainda tivemos de esperar quase uma hora por aqueles que desceram de teleférico. Claro que dissemos à Jenny que afinal nada era como ela contara, mas o cinismo dos chineses é algo a que me vou habituando nestes últimos anos. A inglesa, essa, pura e simplesmente armou o burro e deitou-lhe uns olhos que a chinesa ainda deve estar a arder com a fúria alheia.

Foi pena que na visita à Grande Muralha o que tenha dominado tivesse sido o sentimento de que poderíamos ter estado uma manhã ou tarde inteiras a caminhar pelo cenário sem pressas ou pressões. Isto porque é perfeitamente possível chegar até Badaling de transportes públicos desde Pequim.

Ainda assim, foi um momento alto da nossa viagem.

Custa a crer que outrora alguém tivesse criado aquela obra impressionante. Aquela zona é praticamente um deserto montanhoso para onde tiveram de ser deslocadas toneladas de pedra para levantar as muralhas, que nalguns troços são enorme. No entanto, outras zonas há longe de Pequim que, essas sim, são verdadeiros desertos. Depois, a sua implantação na paisagem parece ter sido decidida por um artista, tão belo é o ziguezaguear da muralha na montanha.

Em resumo, fiquei com vontade de explorar a sério, caminhando livremente, outros troços da Grande Muralha da China.

 

quarta-feira, julho 30, 2014

Parque Jingshan

 

 Uma visita ao Parque Jingshan é também memorável.
Pela animação que lá se vive - multidões de reformados a passearem sozinhos ou com os seus netos -, pela cor - canteiros e mais canteiros de flores intensamente adornados, prontos para um qualquer concurso - e pelas vistas fabulosas da cidade de Pequim, incluindo da vizinha Cidade Proibida.


Mais Pequim

À parte os monumentos que destaquei em posts autónomos, bem como a comida - o pato à Pequim do Dadong pode já ter saído do meu paladar, mas não sairá da minha memória gustativa - e o gelado de alecrim e o de chá verde, muito mais há para viver em Pequim.

A rua mais emblemática da capital, género de Rua Augusta, é a Wangfujing. Aqui temos comércio tradicional, algumas lojas da moda, um centro comercial que parece não ter fim, um mercado de artesanato e outro de comida. Na amálgama de estilos parece ser um bom exemplo do que é a China.


A China moderna, essa, está em Sanlitun, onde se vê o gosto e maneiras ocidentais. Aqui perto fica o edifício da CCTV, a televisão chinesa, de Rem Koolhaas, artisticamente implantado numa zona onde já existem um quantos arranha-céus e muitos outros estão na calha para virem a emergir dos imensos buracos que já foram esventrados. O desenho é de outro mundo, tal como já tínhamos experimentado com a Casa da Música do Porto.



Outros dos maiores arquitectos do mundo deixaram também a sua marca na paisagem de Pequim. É caso da dupla Herzog & De Meuron e do seu mais do que elogiado estádio conhecido como Ninho de Pássaro. É o Estádio Nacional de Pequim, que serviu de palco para os inesquecíveis Jogos Olímpicos de 2008. A sua arquitectura é belíssima, concreto intrincado que parece ir fazendo lacinhos aqui e acolá. O jogo de cores que sobre ele incide à noite consegue torná-lo ainda mais bonito. Idem para o Cubo de Água, o complexo onde decorreram as provas de natação. Este edifício não é de desdenhar durante o dia, mas à noite consegue entender-se na perfeição as bolhas de água que o decoram à medida que as diversas cores se vão revelando.


A torre olímpica é uma boa companhia para estas duas peças superiores. Agora, há que referir que o ambiente que se vive no Parque Olímpico é de tudo menos de desporto. Aquilo parece uma feira foleira que, não fossem as dimensões desmedidas, poder-se-ia dizer que mais parecia uma aldeia. Enfim, a arquitectura pode ser do mais moderno que há, mas isto é a China e os chineses.



Todavia, para contrariar o que acabei de escrever, eis o Distrito da Arte 798. Continua a ser a China e os chineses, mas estes artistas já não são de feira. Num antigo complexo industrial, cheio de fábricas e de edifícios abandonados, foram-se instalando uma série de galerias de arte contemporânea. O lugar é tão grande, quarteirões e mais quarteirões, ruelas e becos para nos perdermos, que facilmente podemos passar aqui um dia inteiro. Existem restaurantes e bares, lojas de arte, mobiliário, roupa, galerias e, sobretudo, muita arte de rua - graffitis e esculturas.



Mas porque é tradição e sobretudo um toque de oriente que querermos quando viajamos a Pequim, temos ainda para nos deleitarmos uns quantos templos, entre os quais o Templo Lama e o Templo de Confúcio, quase um ao lado do outro. O primeiro é um dos maiores templos budistas e cor e movimento é o que aqui se observa. O segundo é muito mais pacato e consegue-se viver aqui momentos de tranquilidade.




No entanto, uma das melhores experiências que se pode ter em Pequim é caminhar pelos seus hutongs, as ruelas que ainda sobrevivem no centro da capital e onde podemos literalmente entrar pelas casas e vidas adentro dos locais. A rua e a casa confundem-se de tal maneira que quando damos por nós não estamos numa rua sem saída, antes na casa de alguém. À porta das casa, ou junto a uma janela ou tão somente parede, vemos uma bicicleta encostada, mas também roupa estendida ou um armário em uso. Historicamente, os hutongs são do templo dos mongóis, século XIII, mas cresceram com os Ming, século XV. Nos últimos anos muitos têm vindo a ser demolidos para dar lugar a edifícios e ruas mais modernas. Mas é ainda fácil darmos de caras com um hutong. A zona de Nanluogu Xiang será a mais evidente para explorar, até porque aqui foram bem sucedidas as tentativas de recuperação, mas um pouco por todo o lado eles existem. É só metermo-nos ao caminho e ... ei-los. Por exemplo, no nosso primeiro dia em Pequim, um domingo, passámos a tarde na zona dos parques e lagos Houhai e Beihai - óptimos caso não se suporte estar sozinho. Alugámos uma bicicleta e fomos pedalando à volta do lago e um pouco pelo interior dos bairros. Foi logo, rapidamente sentimos um cheirinho daquilo que imaginávamos a China mais tradicional.


O que retirei da viagem à cidade de Pequim é que é uma cidade em franca renovação, mas onde aqui e ali, onde menos se espera, o tempo parece ter parado. A jornada em que fomos assistir à Ópera de Pequim é elucidativa: o Huguang Huiguan é um teatro tradicional, absolutamente pitoresco e acolhedor, mas só lá se encontra turistas. A zona da cidade onde se encontra não é feia nem bonita, nem nova nem velha. Mas para se ir daqui a pé até à Praça Tiananmen - uma daquelas coisas não muito óbvias que gostamos de fazer - passa-se por uma rua de edifícios baixos e velhos, em terra batida, com comida de rua, um qualquer hutong esquecido. E de repente estamos na Rua Qianmen, toda bonitinha, recuperada, enfeitada, cheia de lojas da moda.

Ou seja, uma cidade para todos os gostos.

Pode-se pedir mais?

terça-feira, julho 29, 2014

Palácio de Verão - mais algumas fotos

 






Palácio de Verão

 

Um pouco mais afastado do centro de Pequim, mas ligado por metro, fica o Palácio de Verão.

Não confundir com o Velho Palácio de Verão, destruído pelas tropas britânicas e francesas durante a Segunda Guerra do Ópio, em 1860. Este, porém, também sofreu com a dita guerra e foi Cixi, a imperatriz viúva que governou efectivamente as últimas décadas da China imperial, que tomou em mãos a empreitada de o reconstruir.

A arquitectura que encontramos no Palácio de Verão não é muito diferente daquela que já havíamos encontrado na Cidade Proibida. É também um complexo de templos, jardins, pavilhões, lagos e pontes.

Mas tal não quer dizer que não mereça a pena a visita. Pelo contrário, os edifícios são aqui mais elaborados e encantadores e o enquadramento paisagístico é imbatível. O verde luxuriante é uma presença constante, assim como o é o Lago Kunming, no qual não se deve perder um passeio de barco. Pena que o céu de Pequim por estes dias (será que não é sempre assim?) não estivesse claro para admirarmos a paisagem em toda a sua plenitude.

O Palácio de Verão tomou como nome original Jardim das Ondas Claras quando no século XVIII o imperador Qianlong aqui decidiu construir um jardim. Pegando no antigo reservatório da dinastia mongol Yuan transformou-o no referido Lago Kunming que, a par da Colina da Longevidade, viriam a ser as duas grandes referências do monumento. Só mais tarde seria adoptado o nome de Palácio de Verão, quando se tornou retiro da corte imperial.

O complexo ocupa uma área de 290 hectares e inclui cerca de 3000 edifícios. Combinava funções políticas, administrativas, residenciais, espirituais e recreativas. Hoje, quando o visitamos, tentando fugir à multidão de parceiros de visita, o que vemos é um equilíbrio perfeito entre a obra do homem e a natureza.


Existem várias entradas, mas a que tomámos deixou-nos num pátio junto a um dos templos onde nos deu logo curiosidade de espreitar o que haveria nas suas traseiras. O cenário era parecido com algo que havíamos visto algures no centro de Pequim, os característicos telhados cinzentos ondulados. Aqui, muitas rotas de visita pareciam possíveis e, acaso pretendêssemos embrenharmo-nos pela imensa vegetação do jardim, teríamos entretém para o dia inteiro. Resolvemos seguir junto ao lago, numa espécie de promenade que logo vai ter ao Longo Corredor. Este é belíssimo, jogo de cores perfeito e com motivos decorativos como pinturas que revelam cenas da história da China e mitos populares.




Mas a grande atracção é a Colina da Longevidade e as construções que acolhe, como o Pavilhão da Fragrância Budista e o Templo Budista do Mar da Sabedoria. Estes nomes são qualquer coisa, todo um programa. A subida até lá bem acima vale todo o esforço, não só pelo que vamos descobrindo pelo caminho, como pela paisagem que nos espera.


Outra das atracções do Palácio de Verão é o extravagante Barco de Mármore construído em 1755 e mandado restaurar por Cixi em 1893 quando o dinheiro já não abundava e estava destinado para a modernização das forças de defesa do país, nomeadamente naval.


Daqui, o melhor que podemos fazer, em alternativa à longa e demorada caminhada em volta do lago, é atravessá-lo num dos barcos mascarados de dragão para chegar até ao lugar onde existe a pitoresca ponte, também em mármore, que dá para uma ilhota onde está instalado um templo. Infelizmente, por altura da nossa visita, este estava em obras. Nada que aborreça muito, uma vez que o que estava a descoberto foi suficiente para nos encantar.

Templo do Céu

O Templo do Céu, ou altar do céu, é outra das atracções de Pequim que não pode ser perdida.

Mandado construir pelo imperador Yongle, tal como a Cidade Proibida, no princípio do século XV, é um belo exemplo da arquitectura Ming, embora posteriormente fosse sendo objecto de várias adaptações e reconstruções, quer ainda durante a dinastia Ming como posteriormente na Qing.

Este complexo abarca diversos edifícios e um parque fantástico, de que os chineses fazem bom uso, seja para praticar exercício físico seja para conviver. Como não fomos visitá-lo de manhã cedo, não apanhamos os chinoquinhas a fazer tai-chi, mas apanhámo-los em animadas sessões de cartas e mah-jong e em amenas cavaqueiras.




O parque é enorme e belíssimo e é abrigo de diversas espécies de árvores. O que mais encantou, sobretudo, foram as cores em exibição, variadas mas todas elas encantadoras, num espaço soberbamente arranjado onde impera a ordem, a harmonia e a beleza.

Quanto ao Templo do Céu em si, este é o lugar onde os imperadores vinham todos os anos, como filhos do céu, para renovar a sua dignidade imperial, expiar os pecados do seu povo e pedir boas colheitas. Para esse efeito, aqui eram levadas a cabo cerimónias e rituais não só de preces, mas também de sacrifícios. Este é, pois, um altar de sacrifícios onde se faziam cerimónias de adoração do céu.



O complexo é composto por diversos salões, corredores e altares. O que mais me seduziu foi o Salão das Preces para as Boas Colheitas, um edifício de três andares, cada um deles simbolizando a humanidade, a terra e o céu. O céu é o mais alto e a terra o mais baixo, reflectindo o conhecimento chinês ancestral segundo o qual o céu é redondo e a terra é quadrada. O mármore e a sua forma transmitem uma elegância sem palavras.

quinta-feira, julho 24, 2014

Cidade Proibida


Antes de mais, quando se fala em visitar Pequim ouve-se "Cidade Proibida" como a sua maior atracção. Mas a maior parte das pessoas não amante da China ou de viagens pergunta-se, "mas o que é que é isso de Cidade Proibida"?

Explicando basicamente, é o lugar que anteriormente estava fora do centro cidade e que os imperadores escolheram para habitar, junto das suas concubinas e eunucos. Só eles podiam aqui entrar, daí a designação de Cidade Proibida. Hoje tudo é diferente e qualquer pessoa, desde que pague cerca de 7 euros, pode e deve visitar este complexo, filmado pela primeira vez por Bernardo Bertoluci para o seu oscarizado filme "O último imperador".

A Cidade Proibida foi mandada construir em 1406 pelo imperador Ming Yongle, o mesmo que então decidiu a transferência da capital de Nanquim para Pequim. Demorou 14 anos a construir, tendo participado na empreitada mais de um milhão de trabalhadores chineses, e serviu de palácio imperial para todos os imperadores das dinastias Ming e Qing, qualquer coisa como 500 anos de história dinástica terminada com o último imperador, Puyi, em 1912 - precisamente aquele retratado pelo filme de Bertoluci.


Hoje a sua entrada tem o enorme retrato de Mao Zedong a dar as boas vindas. Esta é a Porta da Paz Celestial que dá para a Praça Tiananmen. A escala aqui é enorme.

Da Praça Tiananmen já havia falado em post anterior.

Quanto à Cidade Proibida, o complexo em forma rectangular reúne cerca de 900 edifícios, mais jardins, portas, pontes, lagos, templos, até óperas. São à volta de 720000 metros quadrados cercados por muros de 10 metros de altura e envolvidos por um fosso de água de 52 metros de largura. Uma verdadeira cidade.

No seu desenho é visível que houve aqui muito planeamento. A simetria é evidente e houve uma preocupação com a geomancia e de se obedecer aos princípios do yin e yang. Também a hierarquia que esta cidade pretende simbolizar fica aqui evidente pela disposição dos seus edifícios. Com efeito, os mais importantes encontram-se ao centro, como templos e salões, deixando as laterais para aqueles mais privados.

Uma das imagens mais fortes da Cidade Proibida são as suas cores. Propositadamente foi escolhido o amarelo para os telhados dos edifícios, sendo o amarelo na cultura chinesa a cor reservada aos imperadores, representando o seu poder e a sua proximidade a Deus. Já o vermelho que domina nos muros e nos edifícios representa a prosperidade.

O que vemos hoje aberto ao público é apenas uma parte de todo o complexo da Cidade Proibida, talvez nem metade de todo o espaço. Ainda assim, muitas horas de visita são aqui consumidas.

Para além da sua arquitectura, aqui ficam os melhores museus da China, apresentando colecções de porcelana, jade e outros objectos imperiais. Aliás, a designação oficial da Cidade Proibida é hoje "Museu do Palácio", o que nos criou alguma confusão no momento de comprar o bilhete de entrada, pois não desejávamos ir para o Museu, antes para a Cidade. Fora a confusão criada pela quantidade de gente que estava nas imediações da Cidade Proibida na segunda-feira, dia por mim destinado para a visitar, sem saber que nesse dia está encerrada. Valeu-me mais uma acusação de ser "pouco focada" por parte da mana.

Lá voltámos no dia seguinte para constatar que aquela quantidade de gente não era, afinal, assim tanta. Até custa a querer que ainda haja mais chineses. De certeza que eles não estavam lá todos ao pé de nós naquele dia?

Uma das coisas mais irritantes quando se viaja é não poder ver as coisas com calma, sem confusão e sem necessidade de nos pormos constantemente em bicos de pés para conseguir espreitar um buda que seja. Em Pequim foi uma constante: demasiada gente onde quer que se fosse.


 
No caso da Cidade Proibida, porém, se é impossível apreciar bem os pormenores da sua arquitectura na zona central, tal já é mais possível quando se foge um bocadinho do óbvio, do super turístico. Então, aí podemos apreciar quase sozinhas os deliciosos pavilhões e seus pátios.

 
Na minha memória ficará, acima de tudo, o Palácio da Paz e da Longevidade, situado na parte nordeste da Cidade Proibida. Esta é como se fosse uma autêntica cidade dentro da cidade. O bilhete de entrada para a Cidade Proibida não inclui a entrada neste espaço, daí que tenhamos que comprar um outro bilhete e, talvez por isso, indivíduos é coisa que não abunda por aqui - coisa rara e feliz. À sua entrada somos recebidos pelo painel dos Nove Dragões, destinado a protecção contra os maus espíritos. Aqui viviam as imperatrizes viúvas e as concubinas imperiais. Os pavilhões vão-se sucedendo, bem como os pátios com delicados jardins. Mas o rei da delicadeza é o Pavilhão das Alegres Melodias, a casa da ópera num edifício de três andares.

 


No entanto, são os enormes salões cerimoniais que dominam a paisagem, ou não ficassem eles no centro. Depois de passarmos a Porta do Meridiano entramos num enorme pátio com vista para a fantástica Porta da Suprema Harmonia, o maior e mais importante edifício da Cidade Proibida. Nas laterais existem diversas salas transformadas em museus. Em seguida é irmos atravessando um a um os salões cerimoniais, junto da confusão, mas a tentação de escapar sempre para as laterais é grande. A noroeste da Cidade Proibida ficam os Palácios Ocidentais e, apesar da estreiteza dos seus caminhos, consegue-se espreitar sem muitos encontrões os seus segredos. O contraste de cores é aqui muito forte e belíssimo.
 

 

 
Na parte central a norte, junto à saída, é a confusão total, mas dá para perceber a beleza do jardim imperial.

Um pormenor interessante. Cada edifício é decorado com umas pequenas e pitorescas estátuas, conhecidas como os guardiões, criaturas míticas que protegem o dragão imperial; a sua importância afere-se através do número que cada um apresenta - 10 é o máximo das estátuas e o máximo da importância (encontramos esta ideia não apenas nos edifícios da Cidade Proibida).


Outros pormenores em foto,



Para concluir o tópico Cidade Proibida neste post, dizer que se hoje o monumento é uma unanimidade como património da humanidade, para os comunistas o assunto nem sempre foi fácil. Quando Mao ascendeu ao poder e criou a República Popular da China em 1949 ficou com um dúvida existencial - que fazer com toda aquela ostentação imperial quando o seu pensamento era contra a tradição? Diz-se que foi mais uma vez o providencial Zhou Enlai a salvar da destruição este ícone da China imperial.