terça-feira, fevereiro 05, 2008

Museus à Borla em Londres

Os museus em Londres são gratuitos. Ou melhor dito, as exposições permanentes dos museus londrinos são de graça.
E isso é bom?
Depende. Do quê? Do trabalho de casa – neste caso é obrigatório escolher-se previamente o que se querer ver.
O nosso trabalho de casa, está mesmo a ver-se, não foi para nota 20. Na verdade, pese embora todas as boas intenções de se conhecer o mais que poderíamos em 2 ou 3 dias, nem ao bom chegámos.
Postas as exposições temporárias de lado, ficámos, ainda assim, com um bom dilema entre braços: com o anoitecer em Londres a chegar pelas 16:00 (não é à toa que os bifes se fartam de elogiar a nossa quantidade de raios de sol) e com os museus a encerrarem pelas 17:30 – 18:00 (ainda que com 1 dia da semana com horários mais prolongados), a escolha colocava-se ainda entre caminhar entre o pulsar das ruas enquanto era dia ou enfiarmo-nos durante esse mesmo dia nos museus.



Acabámos por aproveitar o dia / noite em que a Tate Modern fechava mais tarde e conseguimos ver as suas exposições gratuitas decentemente.
Logo à entrada da colecção de arte contemporânea internacional desta Tate (a de arte nacional fica com a Tate Britain) deparamo-nos com Maman, a aranha gigante de Louise Bourgeois (que tem uma réplica também no Guggheinheim de Bilbao), bem junto ao Rio Tamisa a olhar olhos nos olhos a St Paul´s Cathedral.



O edifício da Tate Modern era anteriormente uma central eléctrica e foi excelentemente reconvertido em museu pelos arquitectos Herzog & de Meuron. A sua localização é fantástica, seja qual for a perspectiva em que nos encontramos: venhamos de caminhar de qualquer um dos lados (do Eye ou da Tower Bridge) deste lado sul do Tamisa, venhamos de atravessar a Millennium Bridge desde a St Paul´s Cathedral ou venhamos até ao 7.º piso do edifício onde fica instalado o restaurante do museu com uma vista soberba de Londres.
A Tate Modern tem vindo a ser considerada não apenas um museu mas também como que uma espécie de parque de diversões.
Vindo até cá entende-se bem.
E fica ainda a entender-se como foi possível que no ano de 2006 tivesse estado aqui em exibição uma instalação de um tobogã que fez com que as crianças desejassem visitar o museu (“Test Site” de Carsten Holler). Afinal de contas, a Turbine Hall, um espaço de 35 metros de altura e 152 metros de comprimento, presta-se a isto e muito mais.
Desta vez a ocupação desde mega espaço foi entregue a Doris Salcedo que aqui trouxe “Shibboleth” e à entrada avisa-se qualquer coisa do género “cuidado onde põe os pés, não caia no buraco”. A artista resolveu apresentar um trabalho que se inicia com uma estreita fenda no chão que se prolonga pela dita centena e meia de metros e que a meio do caminho se vai alargando tanto que se torna mesmo possível que um pé inteiro (ou os dois) lá caiba dentro. Salcedo, colombiana, diz que pretendeu representar as fronteiras, a experiência dos emigrantes e sua segregação, a visão de uma pessoa do 3.º mundo que vem até ao coração da Europa (afirmou ao Sunday Times “It represents borders, the experience of immigrants, the experience of segregation, the experience of racial hatred. It is the experience of a Third World person coming into the heart of Europe. For example, the space which illegal immigrants occupy is a negative space. And so this piece is a negative space. http://entertainment.timesonline.co.uk/tol/arts_and_entertainment/visual_arts/article2617536.ece)
Não sei é se terá muito cabimento para mim apresentar a mesma explicação para o que se passa na garagem do meu prédio, com fendas que mais parecem cópias destas de Salcedo na Tate Modern. Terá Doris andado em instalações no piso -2 da minha garagem? Serão os emigrantes do 3.º mundo? Ou será só uma coincidência?



Feliz coincidência é poder ver obras de Juan Muñoz num qualquer lugar pelo mundo.
Está bem que em Lisboa tal será possível (Berardo tem pelo menos uma obra do espanhol) e no Porto é no minuto que quisermos (basta ir ao Jardim da Cordoaria).
Mas foi muito bonito que ao final do dia, e inesperadamente, tenha ficado a saber que a Tate Modern tem algumas delas expostas, para além de lhe dedicar neste momento uma retrospectiva (desde o fim de Janeiro e até ao fim de Abril). Ao lado deste artista espanhol estão também representados na Tate, como não podia deixar de ser pela pujança da cultura de nuestros hermanos, mais umas duas mãos cheias de seus compatriotas com Picasso à cabeça.
Ainda, como piada e como forma de mostrar que a arte pode ser banal, uma réplica do famoso “Fountain”, vulgo Urinol, de Marcel Duchamp está aqui presente numa sala a poucos metros de uma série de máquinas com variados jogos sempre ocupadas pelos visitantes que se entretêm a distrair os olhos e a mente de tanta contemporaneidade.


Quanto ao British Museum não é exagerado dizer que quase não passámos do Great Court – a tal praça que com a intervenção de Norman Foster em 2000 se tornou a maior coberta da Europa. E ainda que valha a pena vir aqui só para ver esta obra arquitectónica (todo o edifício e não apenas o seu Great Court), é uma pena que não dediquemos nem 1/10 da nossa atenção à colecção deste museu que é, tão somente, um dos maiores do mundo, quer na extensão das suas peças como na sua importância artística e cultural.
A sua colecção abarca verdadeiros tesouros trazidos para Inglaterra pelos Indiana Jones da vida (que, há que dizê-lo com frontalidade, não trouxeram tudo para aqui, deixando muito mais para outras grandes potências – não consigo esquecer que há uma década vi a cidade de Pergamon em Berlim mas nem em fotografias a consigo ver na Turquia).
Dado o pouco tempo que nos restava optámos por nos dirigir directamente aos “highlights” que o próprio museu escolhera. Ou seja, esculturas monumentais quase intactas dos faraós e suas múmias, no que à arte egípcia diz respeito; grandes pedaços da Acrópole de Atenas, incluindo imensos mármores retirados (e agora reclamados pelas autoridades gregas) quase por inteiro ao Parthenon, com esculturas suficientes para que sozinhas resultem num bom museu, no que à arte da antiga Grécia diz respeito.
E foi tudo o que vimos. O elenco do que não vimos não cabe sequer nestas páginas. Mas cabe, sim, uma lágrima derramada por termos perdido a exposição temporária do exército chinês em terracota – desta é que não se pode dizer que fica para a próxima.



No 1.º dia do ano tivemos ainda uns minutos para uma olhadela à National Portrait Gallery, junto à National Gallery. Uma colecção imensa de retratos de várias épocas e em vários suportes, por onde caminhámos rapidamente até chegarmos à sala nossa contemporânea. Aqui reconhecemos diversos personagens desde Winston Churcilll, Doris Lessing, Paul McCartney, os Blur de Julian Opie ou a omnipresente Diana.
Mais um a ver com a máxima atenção e, de preferência, a não repetir num pacote juntamente com o vizinho National Gallery – para não cansar de tanta cultura gratuita.