sábado, setembro 19, 2015

Bruxelas, Capital da Banda Desenhada

Se preciso fosse, um bom pretexto para visitar Bruxelas é o tema da banda desenhada.
Para mim, que desde pequena convivi com os livros de Lucky Luke e Michel Vaillant, ao lado dos tios patinhas, e até hoje sou fã de quase qualquer livro em quadrinhos, prefira chamar-se-lhe bd, comics ou novela gráfica, Bruxelas seria sempre um ponto alto na minha decisão de passear por uma cidade.
Por todo o centro da cidade, basta estar atento às paredes e empenas dos edifícios e logo surge um dos heróis da bd. Não precisam de ser originalmente belgas, mas de personagens belgas não nos chegam os dedos de todo o corpo para os contar. Alguns exemplos com Tintin à cabeça, pois claro: Spirou, Quick et Flupke (ou Quim e Filipe), os Estrunfes, Blake e Mortimer, Lucky Luke, Gaston Lagaffe, Ric Hochet, Thorgal, Largo Winch, Le Chat e tantos mais.
Face a todo este património, é bastante óbvio e necessário que tenha aparecido em 1991 um projecto de arte mural que se propôs a pintar uns quantos edifícios inspirando-se precisamente em grandes autores da banda desenhada. Tanto serve de homenagem a estes autores e seus (nossos) heróis, como é uma excelente forma de seguirmos pelas ruas de Bruxelas, afastando-nos dos lugares mais batidos, passando a conhecer espaços que de outra forma talvez não déssemos por eles. 
Um exemplo: numa visita rápida a Bruxelas, porquê passar para além do  Quai aux Briques, em Santa Catarina, e seguir até ao Quaix des Péniches? Para ver para crer que há ainda um bocado do rio Senne em Bruxelas, materializado no canal de Charleroi? Não. Para ver Corto Maltese, do italiano Hugo Pratt, nas paredes de um edifício deste cais. Corto, meu herói supremo nestas coisas da bd.


Corto Maltese (Hugo Pratt), Quai de Péniches, 2009

Mas o primeiro mural a aparecer na cidade foi o de Broussaille, inaugurado logo em 1991 segundo um projecto original de Frank Pé. É provavelmente um dos mais conhecidos e até talvez já um dos símbolos de Bruxelas, os dois amigos que caminham felizes, numa parede da Rua du Marché au Charbon, bem perto da Grand Place.

Broussaille (Frank Pé), Rua du Marché au Charbon, 1991

De todos os murais, o meu preferido será talvez o de Tibet & Duchateau, com o personagem Ric Hochet, na Rua de Bon Secours, igualmente perto da Grand Place. Pena que, à semelhança de muitos outros, este mural esteja rabiscado.

Ric Hochet (Tibet & Duchateau), Rua de Bon Secours, 1992

Como não podia deixar de ser, Lucky Luke, Asterix e Blake e Mortimer também marcam presença neste itinerário de arte mural da banda desenhada.

Lucky Luke (Morris) e os assaltantes irmãos Dalton na Rua de la Bouanderie, 1992

Asterix e Obelix (Urdezo e Goscinny) também na Rua de la Bouanderie, dentro do ringue de um jardim de infância, 2005

Blake e Mortimer (Edgar P. Jacobs) na Rua du Petit Rempart, perto de um estranho bloco de edifícios abandonados, 1997

Hergé, esse, não podia faltar. 
Quer com Tintin, 

Rua de Le Etuve, 2005

Gare du Midi

Quer com Quick et Flupke, Rue Haute, bairro de Marolles, 1995 

No Marolles encontramos ainda:

Blondin e Cirage (Jijé), Rue des Capucins, 1998

Odilon Verjus (Laurent Verron), também na Rue des Capucins, 2004
(Josephine Baker)

Existe uma série de entidades que se propõem a guiar o curioso por itinerários de bd na cidade. No entanto, parece-me que não há nada melhor do que fazer o trabalho de casa e visitar aqueles murais que se quer mesmo ver e deixar que o acaso dos nossos passos nos deixe frente a frente aos outros que nos irão, certamente, surpreender em igual medida.


Qualquer apaixonado ou tão somente curioso da banda desenhada não deve perder uma visita ao Centro Belga da Banda Desenhada. Ainda para mais, o edifício que acolhe este museu é um dos muitos exemplos de arte nova que ainda persistem por Bruxelas. Este Centro Belga da Banda Desenhada abarca esta arte de um ponto de vista internacional, procurando mostrar que já desde o tempo da pré-história os homens se expressavam visualmente nas paredes rochosas das cavernas. Mostra-nos também, no início da sua exposição permanente, a influência que o americano Winsor McCay, em especial com a sua personagem Little Nemo, criada no princípio do século passado, veio a ter junto dos autores que se lhe seguiram. Para além de uma mostra dos vários temas a que a bd tem vindo a dedicar-se, é ainda possível vermos várias técnicas utilizadas pelos seus autores para chegarem até ao produto final. Depois, existe o espaço Hergé (Tintin), o espaço Peyo (Estrunfes) e exposições temporárias, para além de um centro de documentação e uma livraria.



Outro ponto obrigatório, mas este implicando uma fuga de Bruxelas, é a visita ao Museu Hergé. Em Louvain-la-Neuve está instalado desde 2009 o Museu Hergé, num projecto arquitectónico de Christian de Portzamparc (Prémio Pritzker em 1994). De Bruxelas a Louvain-la-Neuve são cerca de 60 minutos, com frequência de um comboio por hora. Esta cidade foi criada após os conflitos académicos linguísticos entre flamengos e francófonos na cidade universitária de Louvain nos anos 60 do século passado. Hoje é uma cidade completamente planeada, com residências universitárias e blocos correspondentes às várias faculdades. 
O Museu Hergé, a uma curtíssima caminhada desde a estação do comboio e praça principal da cidade, parece que não é muito popular entre os locais, sendo visitado sobretudo por forasteiros. De qualquer forma, a sua arquitectura é muito interessante, futurista até. 
O museu tem três pisos visitáveis, incluindo espaço expositivo, café e livraria. Dedicado à vida de Hergé (1907-1983), Georges Remi de seu nome (RG são as iniciais do seu nome ao contrário), este belga entrou definitivamente na história ao ter criado a personagem de Tintin, o intrépido jornalista, sempre pronto para aventuras um pouco por todo o mundo e até na lua - chegou lá primeiro que Neil Armstrong.
Hergé começou por criar a personagem Totor, um escuteiro como ele. Muitas outras se seguiriam, mas Tintin tudo absorveu. Neste museu, para além das suas personagens, com especial incisão no mundo de Tintin e países por ele visitado, vemos também objectos do mundo de Hergé e diversos vídeos. A finalizar, as pinturas que Andy Warhol realizou de Hergé.