quinta-feira, janeiro 25, 2007

Bilbao - Parques e Miradouros

Como referi em post anterior, Bilbao é conhecida como “El botxo”, “o buraco”, por ficar situada lá em baixo, com as montanhas protegendo as suas margens. Não tem as 7 colinas, como Lisboa. Nem tem um desnível tão característico e carismático como o da nossa cidade. Mas tem, à semelhança de Lisboa, uns quantos funiculares e elevadores que se propõem vencer a batalha da acessibilidade às partes altas da cidade.

Na Praça do Funicular, bem atrás do Campo de Volantin na direcção da Ponte Zubizurri, de Calatrava, apanha-se o funicular Artxanda. São cerca de 700 metros de subida no confortável eléctrico encarnado. E a chegada ao topo deixa-nos num parque bem cuidado, a convidar ao ócio, lazer ou exercício. E a vista! Para um lado temos a cidade de Bilbao lá em baixo, com a ria de Nervion a dividir a terra e o Guggenheim sempre presente. Para o outro lado temos o aeroporto ao fundo, com o inconfundível traço de Calatrava no seu novo terminal. Em resumo, a pacatez no alto da cidade.


De Artxanda é ainda possível observar-se bem vincado na paisagem a grande área que toma o Parque Etxebarria, que parece querer subir aos ombros do Casco Viejo. É destes pontos mais altos das cidades, “as vistas de pássaro”, que nos permitimos compreender melhor a ocupação dos seus espaços. E daqui observa-se como é ainda marcante a presença da memória da indústria na cidade, nomeadamente pela integração das grandes chaminés nos novos bairros ou na reconversão das antigas zonas industriais em áreas de lazer.


Ao Parque Etxebarria pode aceder-se desde o Casco Viejo, seja por um dos ascensores seja a la pata. Estranhamente (lá calhou), optámos por subir a pé a imensa escadaria de Calzadas de Mallona, dirigindo-nos até à Catedral de Begoña, e descer de ascensor depois de uma volta pelo parque. A mãe é que não achou muita piada à estafante ideia mas..., enfim, a vista desde este outro ponto alto da cidade foi uma vez mais compensadora, sendo muito abrangente e esclarecedora dos contornos de Bilbao.


A área onde hoje se encontra instalado o Parque Etxebarria era, até há 25 anos atrás, ocupada por uma fundição e tornou-se no primeiro exemplo da guinada da cidade de Bilbao rumo à reconversão urbanística. Comparando o que era nos anos 80 e o que é hoje esta parte da cidade, diriamos que esta sofreu um transplante de rosto total e a indústria de ontem deu lugar ao imenso verde de espaço público onde os míudos jogam à bola nos campos informais, correm, andam de skate ou, simplesmente, sentam junto à antiga chaminé contemplando o Casco Viejo lá em baixo.


E já que falamos de parques, passemos então para o Doña Casilda, este já não num ponto elevado da cidade, mas antes ao nível da ria. Bem perto da ria, para ser mais correcta. Este carismático parque, a completar 100 anos, fica situado entre o Palácio Euskalduna (Centro de Congressos) e o Museu de Belas Artes, logo, numa área muito concorrida. No centro do parque encontramos um edifício em estilo romântico, em cujas arcadas se reunem os jovens que animam quem por aí vai pass(e)ando. Não lhe faltam os lagos com os patinhos, realçando a vida campestre. Este parque tem estado em constante renovação e não tem parado de crescer. Hoje, a cafetaria do Museu de Belas Artes está plenamente integrada na área do parque e, por outro lado, este vem ainda estendendo-se para mais próximo da água até tocar e quase se fundir com a área de Abandoibarra colada à ria.


Esta zona circundante à nova Avenida Abandoibarra, que liga o Euskalduna ao Guggenheim, passando pelos recentes hotel Sheraton e centro comercial, oferece-nos um novo parque, conhecido como Paseo de la Memoria. Os seus objectivos são ambiciosos já que se propõe abranger muito para além da área que liga aqueles dois novos símbolos da cidade, estendendo-se por quase toda a orla direita de Bilbao, até às portas do Casco Viejo. No meio deste intenso verde encontramos um sem número de obras de arte pública, incluindo a “Bailarina” de Dali, e um jardim infantil bem em frente do Guggenheim, em cujos cavalinhos passei, aliás, a meia noite de 2006 para 2007. Aqui, à semelhança do que acontece com o nosso Parque das Nações, igualmente um bem sucedido projecto de reconversão urbanística, devemos estar atentos aos detalhes, não só das esculturas que nos vão aparecendo amíude, como também dos candeeiros, dos bancos, dos caixotes de lixo e de todas as outras infra-estruturas que lá estão para nos servir em todos os sentidos.

A Bailarina de Salvador Dali

Os candeeiros do Euskalduna

A mega chávena em frente ao Sheraton

Estamos, então, conversados no que a parques diz respeito? Parece que não. E digo parece porque estes foram apenas aqueles que conseguimos visitar nesta curta jornada, mas muito haverá ainda para descobrir nesta nova cidade com o novo propósito de ser vivida pelos seus habitantes.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Bilbao – Cidade Velha / Cidade Nova

Na generalidade, quando se visita uma cidade, ainda que a mesma esteja conotada com a modernidade e as obras recentes que a revolucionaram, é praticamente impossível não se dedicar parte do nosso tempo ao seu “centro”.
E no caso de Bilbao merece bem a pena que assim seja.
Como o referido em post anterior, a cidade foi fundada no ano de 1300, junto à ria. Até hoje permanece o traçado do que se denominou de “Siete Calles”, também conhecido como o “Casco Viejo”. Estas 7 ruas, estreitas, às quais hoje em dia desembocam mais um sem número de ruas ainda mais estreitas, estão pejadas de tabernas e restaurantes para todas as bolsas, bem como lojas de comércio mais tradicional ou da moda. Muito pitoresco, com as casas bem conservadas e com o seu colorido a dar mais encanto a quem por lá passa.


Como não podia deixar de ser, cidade espanhola sem a sua “Plaza” não é cidade espanhola. Em Bilbao este lugar toma o nome de “Plaza Nueva”, ampla e com arcadas, como se pede, e com uma animação quase constante em todos os minutos dos dias. Às horas das refeições, os locais ficam em pé à porta dos bares / restaurantes (porque não cabe mais ninguém lá dentro) ou sentados na esplanada aí perto. Para nós, pouco habituadas a este tipo de confusões para jantar, foi uma autêntica aventura, primeiro, conseguir pedir ao empregado uma dúzia de pintxos, depois, sair com os pratos empurrando a multidão aglomerada no bar sem os deixar cair.
Enquanto os pais, avós, tios, o que seja, convivem animadamente e bebem qualquer coisa, as crianças brincam, jogam à bola, andam de patins ou de skate no centro da praça. Ao domingo o local transforma-se com as bancas que lá são instaladas por aqueles que querem vender tudo e mais alguma coisa. Antiguidades e não só. Uma mini feira da ladra, onde ao lado dos vendedores mais ou menos profissionais se juntam aqueles que se querem desfazer dos seus tarecos.


Aqui perto do Casco Viejo fica o Mercado de la Ribera, com direito a site na Internet e tudo.
Segundo o site oficial do turismo de Bilbao, em 1990 este mercado de alimentos foi mesmo reconhecido pelo Guiness como o mais completo e é o maior no que diz respeito a número de comerciantes e postos de venda, bem como o maior mercado coberto da Europa, com 10 mil m2. Ufa! Com tantos dados estatísticos, resta acrescentar que o seu edifício, em art-deco, foi construído em 1929 e o seu amplo interior se divide em 3 andares. No rés-do-chão ficam as bancas do peixe, marisco e congelados; no 1.º andar as de carne e charcutarias; e no 2.º andar as de frutas e verduras. Ao tempo que o visitamos, o último andar servia ainda de espaço de exposições.
À frente do mercado encontram-se as arcadas dos edifícios da Rua de la Ribera. É obrigatório olhar para os seus tectos, de outra forma é muito fácil perdermos irremediavelmente um pouco da arte presente nas ruas da cidade. Os tectos estão pintados com motivos diversos – um parece remeter-nos para um imaginário indígena, outro para um ambiente bucólico, logo seguido de outro que relembra a violência da guerra e outro ainda que nos oferece o colorido da cidade moderna, acompanhada pela musicalidade das pautas.


A merecer uma olhada mais atenta, ainda, no centro antigo da cidade destacam-se as várias igrejas (San Antón, San Nicolás, Santiago) e o Teatro Arriaga.


Para além do núcleo mais antigo da cidade, vale igualmente a pena deambular pelas suas zonas mais recentes, não aquela que nos nossos dias anda nas mãos dos arquitectos mais famosos e nas bocas do mundo, mas sim aquelas para a qual Bilbao, tentando combater a falta de espaço, cresceu e se expandiu nos finais do século XIX, cujos projectos foram designados por “El Ensanche”. Daí a criação dos actuais bairros de Begoña, Deustu e Abando. Neste último, na margem esquerda da ria, fica o que hoje se considera o centro da cidade. Centro financeiro e centro de comércio, não abdicando, porém, de conservar áreas residenciais. A Plaza Moyua desempenha um papel de eixo central sendo atravessada pela Gran Via. Pelos quarteirões afora encontram-se alguns edifícios imponentes e elegantes, bem como ricos nos seus pormenores. É aqui nesta zona que estão situados 2 dos 3 mais afamados e populares cafés de Bilbao – o La Granja e o Iruña (o Boulevard fica no Arenal e encontrava-se encerrado aquando da nossa passagem pela cidade). O La Granja parece conservar uma atmosfera algo senhorial, enquanto que o Iruña possui uma decoração mourisca bem vincada quer nos seus azulejos quer em algum do seu mobiliário.


Um pouco mais afastado de Abando, já no que será considerado o bairro Basurto, fica o estádio de San Mamés. O nosso interesse pelo desporto em geral, e o futebol em particular, leva a que não nos esqueçamos de dar uma passada pelos estádios das cidades que visitamos. E aqui, mais uma vez, confirmamos que não é inevitável que estes grandes equipamentos sejam atracções de circo absolutamente disformes, monstruosos e desintegrados do local onde se encontram (logicamente que tenho sempre presente os maus exemplos dos estádios do Sporting e Benfica na minha cidade, Lisboa, e nos bons exemplos dos estádios do Boavista, no Porto, e do Vitória, em Guimarães). O estádio de San Mamés, onde joga o Athletic (a par do Real Madrid e do Barcelona é um dos 3 únicos clubes espanhóis a ter o privilégio de nunca haver sido relegado para a II divisão), ocupa discretamente um quarteirão (à semelhança, aliás, do que acontece com o estádio do Real, em Madrid) desde 1913, o que faz com que seja o mais antigo de Espanha, ainda que tenha sofrido uma profunda reabilitação por ocasião do Mundial FIFA de 1982. Para breve prevê-se a construção de um novo estádio numa área adjacente ao actual.


Por explorar, na zona mais central de Bilbao, ficou o bairro de Deustu, a provar que 3 dias inteiros gastos apenas na cidade não são demais.

sexta-feira, janeiro 05, 2007

Bilbao - Apresentando

Bilbao é carinhosamente conhecida pelos seus habitantes por “El botxo”, ou seja, “o buraco”, dado que a sua situação geográfica a mantém rodeada de montanhas.


Quando disser que vai até Bilbao, a passeio, não será muito provável que oiça vozes a dizer "o que vais fazer para aquele buraco?". Mas é certamente muito provável que oiça vozes a estranhar a escolha do destino argumentando que nada há que fazer / ver nessa cidade industrial. Aí, desconfie: ou o seu interlocutor não está a par da actualidade ou não aprecia a evolução urbanística.
Porque é disso que se trata – a reconversão de uma cidade no sentido de a guiar à modernidade e às exigências que se pedem a uma cidade do século XXI.

Efectivamente, Bilbao, situada no País Basco, norte de Espanha, virada para o Golfo da Biscaia, ganhou fama por ser uma cidade altamente industrial. Antes disso, porém, em 1300 foi-lhe concedido o título de cidade por Don Diego Lopez de Haro, que hoje dá o nome à Gran Via, a avenida das compras por excelência. Foi só no século XIX que Bilbao se desenvolveu e transformou de uma forma intensa, baseada na exploração das zonas mineiras ali perto que levaram a que o comércio marítimo e a actividade portuária crescessem de uma forma exponencial. A acompanhar essa situação, também a indústria siderúrgica e a construção de barcos contribuíram para o seu crescimento económico. Com a chegada dos caminhos-de-ferro no fim daquele século, estava montado o cenário ideal para que Bilbao ganhasse a tal fama de cidade industrial, com maquinaria e edifícios pesados, bem como bairros residenciais de operários.

Acontece que chegou a década de 70 do século XX e com ela o fim da industrialização. Chegou ao fim, igualmente, o Franquismo e com isso veio a democracia e o estatuto de autonomia do País Basco. Mas tal não obstou à inevitabilidade da decadência da cidade, em termos económicos, a qual era mais do que iminente – já tinha chegado. Para agravar ainda mais a situação, em 1983 a cidade sofreu grandes inundações. No entanto, como diz o ditado “há males que vêm por bem” e, face a dois caminhos para se seguir, o de deixar o tempo correr pela cidade ou, pelo contrário, criar a cidade o seu próprio tempo, os poderes públicos que governam Bilbao optaram por este último. Ou seja, realizaram que a necessidade de dar uma nova cara à cidade, criando novas infra-estruturas e serviços, era imperiosa.
Vai daí, pararam para pensar a cidade e em 1992 foi criada a Bilbao Ria 2000, constituída por capitais públicos, com o objectivo de actuar no âmbito do urbanismo, transportes e meio ambiente – o tridente da moda –, recuperando zonas degradadas ou áreas industriais em declínio na área metropolitana de Bilbao.
De notar que esta área metropolitana é composta por quase 1 milhão de habitantes, ainda que a cidade de Bilbao tenha apenas cerca de 300 mil.

O que se observa hoje é uma cidade pujante, cheia de vida nas ruas (o que é comum a muitas cidades espanholas), as quais estão ocupadas com as lojas das melhores marcas mundiais, com restaurantes e uma gastronomia altamente elogiada, oferta cultural ao nível de uma capital, uma rede de transportes eficiente e variada e, talvez o mais visível, um atelier a céu aberto no qual os grandes nomes da arquitectura mundial fazem questão de marcar presença.
Concluo esta introdução à cidade realçando brevemente estes dois últimos aspectos: os transportes e os arquitectos.


Quanto aos transportes, para além do comum autocarro (Bilbobus), existe ainda a possibilidade de nos movermos através do agradável, moderno e rápido Euskotran (um eléctrico verde, em todos os sentidos, do século XXI) e do Metro .


O Metro foi desenhado por Norman Foster (escolhido para recuperar o bairro da Boavista, em Lisboa, cujo projecto se viu envolvido em polémica por contemplar um torre de 100 metros de altura, contrariando o PDM local). Graças à originalidade das suas entradas em Bilbao, logo designadas pelos locais por “fosteritos”, a sua imagem é hoje reconhecida em qualquer canto do mundo. Em 1998 o Metro de Bilbao ganhou o Premio Brunel de Arquitectura ferroviária. Dispõe de duas linhas que não se limitam à área da cidade, antes nos levam até Portugalete, uma, e Plentzia, junto às praias, a outra.
A cidade está ainda provida de comboios e aviões. O seu aeroporto é também um dos focos de atenção do mundo – o novo terminal, concluído em 2000, é obra de Santiago Calatrava, o espanhol nosso conhecido por ser autor da Gare do Oriente em Lisboa. Encontram-se algumas semelhanças em vários detalhes das duas obras, graças ao estilo inconfundível das criações de Calatrava.

Aproveitando a deixa da referência a Calatrava, entremos então no tema arquitectura e comecemos por referir que este arquitecto espanhol deixou também a sua marca no traço da ponte Zubizuri, a mais original e facilmente confundível com a nova imagem da cidade. Este símbolo é apenas superado pelo edifício do Museu Guggenheim, desenhado pelo arquitecto americano Frank O. Gehry, o mesmo que o nosso ex-presidente da Câmara Municipal de Lisboa escolheu para recuperar os terrenos do Parque Mayer (aí vão três as comparações com arquitectos que também projectaram para Lisboa; a diferença é que em Bilbao foram em frente sem medo da mudança e do “abalo” urbanístico e em Lisboa se hesita e se esbarra nas burocracias instaladas). Voltando ao Guggenheim, esta obra confunde-se com a cidade e foi, definitivamente, o foco catalizador para toda esta força e vitalidade que Bilbao demonstra. Mas há mais: o novo Palácio Euskalduna de Congressos e de Música, de 1999, a ampliação do Parque de Doña Casilda, junto ao Euskaduna, Guggenheim e Nervión; toda a frente ribeirinha do Abando e Campo de Volantin, consagrada exclusivamente ao ócio, lazer ou prática de desportos ao ar livre – corrida, patins e bicicleta.


E as transformações não param. Para breve prevê-se o andamento da reconversão de uma outra zona da cidade, uma península no meio da ria junto ao bairro de Deusto, cujo projecto foi designado “Zorrotzaurre Skyline” e é de autoria de outro nome consagrado da arquitectura: desta vez uma senhora, a iraquiana Zaha Hadid.

Como se vê, Bilbao tem tudo o que se quer / espera de uma cidade, incluindo uma vila mártir a poucos quilómetros – Guernica – e praias a igual distância, com direito ao bónus de uma das melhores ondas para o surf da Europa (se não a melhor) – Mundaka.
Como diriam os brasileiros, “Bilbao está podendo”.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

23:59 – 00:00 (2006-2007)


Poucos locais mais insipiradores para se passar o ano haverá do que fazê-lo face a face com uma das maiores obras de arquitectura moderna. E se o fizermos com menos de uma dezena de pessoas à volta então...
Junto ao Guggenheim de Bilbao, numa noite convidativa, sem muito frio, e com os locais espanhóis retidos em suas casas, com a família e amigos, e entretidos a mandar foguetes das suas janelas para os céus (incluindo para as placas de titânio que fazem a fama do edifício projectado por Frank O. Gehry), coube-me, assim, o privilégio de virar o ano na melhor companhia e no melhor local.
Depois, enquanto os bilbainos saiam finalmente para as ruas para comemorar, passeei junto ao estreito rio Nervion e atravessei a ponte Zubizuri, desenhada por Calatrava, retornando serenamente até ao quarto de hotel.
Um 2007 de muitos passeios, é o que se espera.