segunda-feira, setembro 28, 2015

Gent

Na época medieval Gent chegou a ser a maior cidade da Europa depois de Paris e Constantinopla. Os têxteis eram o motor da sua maior indústria.
A sua importância revela-se ainda por ser o lugar de nascimento de Charles V, o homem que no século XVI tornou-se imperador do Sagrado Império Romano (e reinou como Carlos I em Espanha). Já no século XIX, Gent foi a primeira cidade da Flandres a abraçar a revolução industrial. 


Hoje é a capital da província da Flandres Oriental e a terceira maior cidade belga, atrás de Bruxelas e Antuérpia. É a maior cidade universitária da Flandres e isso percebe-se quando se chega à sua estação Saint Pieters de comboio. São milhares e milhares de bicicletas amontoadas nas suas imediações, o meio de transporte privilegiado dos estudantes (e não só) flamengos. 
As minhas memórias foram logo despertadas face a este cenário, recordando-me quando na Maastricht dos anos 80 não queria acreditar nos parques para bicicletas maiores do que os parques para automóveis que nós tínhamos na nossa Lisboa.

Existem duas estações em Gent, mas à Saint Pieters chegam os comboios rápidos vindos de Bruxelas. Esta estação fica a cerca de três quilómetros do centro da cidade, os quais podem ser percorridos num tram que segue sempre recto até à principal praça de Gent. Como gosto de caminhar optei por ir a pé e ainda tive a sorte de me perder, pelo que fui parar a uma zona da cidade que de outra forma não chegaria a conhecer. Canais tranquilos, zonas residenciais pacatas, blocos universitários de igual tranquilidade e pacatez. 



Cheguei onde queria e iniciei o meu passeio em Gent pela sua beguinaria mais central, perto do castelo Gravensteen (construção do século XII a que não falta sequer um fosso de água. A Oude Begijnhof tem uma pracinha central com um relvado verde em perfeita comunhão com a igreja de tiras de tijolo ocre e torre em tons vermelhos e violeta. As suas ruas estreitas têm, como é típico, os edifícios de baixa altura (normalmente um piso) num branco intenso.

As cores são, está visto, um dos pontos altos da cidade. Um dia em Gent chega para se conhecer o centro histórico da cidade e as suas maiores atracções, uma vez que a cidade, apesar da terceira maior do seu país, não é grande. Fiquei apenas parte de um dia, deixando Gent a meio da tarde sob uma chuvada inclemente a que nem as livrarias serviram de alternativa (os livros estão todos em holandês), e com isso perdi a hipótese de a ver, seus canais e seus edifícios, a mudar de tom.




A zona do canal entre as pontes St-Michielshelling e Grasburg é a mais bonita pelo conjunto da água e da arquitectura dos seus edifícios de topo triangular que nos dão a ilusão de lá podermos chegar subindo aquilo que parecem ser pequenos degraus. Curiosamente, estes edifícios são quase todos eles do século XX, o que não retira nenhum pó da alegria que sentimos por aqui estar.




Seguindo o canal, à sua direita fica o bairro de Patershol. Chão empedrado, edifícios coloridos e bem decorados, caminho por aqui em sossego e sozinha. Aqui percebo que Gent, na primeira segunda-feira de Setembro, é tudo menos turística. Ainda bem. Continuo a caminhar pelas ruas estreitas de Patershol e admiro com gosto as fachadas dos seus edifícios cobertas com jardins verticais. Já junto ao canal, as fachadas do bairro são mais ricas e têm pormenores deliciosos, obras de arte até. 
Atravessando a pequena ponte, sempre tudo tão bonito em redor, janelas abertas, floreiras em cada canto, chego à imensa Praça Vrijdagmarkt (mercado da sexta-feira). 




Depois de atravessar uma ruela coberta de graffitis, a lembrar que esta é uma cidade jovem, é a vez de ir ao encontro de mais praças: são três praças contínuas onde ficam a igreja, o campanário, a catedral e o edifício da câmara municipal.

A St Baafskathedraal é imperdível quer pela sua beleza interior quer por acolher obras de Rubens e de Van Eyck. Infelizmente a "A Adoração do Cordeiro Místico" deste último estava de férias noutro lugar que não naquela que é a sua residência oficial. 


Subi depois ao vizinho Campanário, edifício do século XIV, para ver as vistas de Gent como só os passarinhos a conseguem ter. A subida é fácil, praticamente toda de elevador, daí que cheguei ao topo folgada física e mentalmente. Mas este ânimo mudou repentinamente quando começou a chover de uma forma tal que perdi qualquer expectativa de poder sentar na relva de um qualquer jardim a relaxar e deixar-me estar a contemplar e sentir o ambiente de Gent no fim da tarde. 


Foi assim que deixei a cidade (tinha visto na meteorologia que a tarde iria continuar com chuva forte), seguindo a pé novamente até à estação dos comboios, mas desta vez pela rua Veldstraat, a rua do comércio de Gent e das livrarias em holandês, a língua da Flandres.