sexta-feira, julho 15, 2016

Colômbia em livros, filmes e canções

A preparação de uma viagem já é em si uma verdadeira viagem. 
E uma daquelas viagens bem diversas, instrutivas e prazerosas.
A maior parte das vezes o caminho inicia-se com um guia da Lonely Planet.
Com o planeamento da visita à Colômbia não foi diferente.
Início e fim na sua capital, Bogota, e eis que o Andes Sem Parar voltará, enfim, aos Andes que lhe dá nome.
Depois é só traçar um itinerário, a descobrir em futuros posts aqui neste blogue.
Parte essencial da viagem são as leituras dos escritores do país que se pretende visitar. No caso da Colômbia a coisa está facilitada: alguém há nesse mundo que nunca tenha lido um só livro que seja de Gabriel Garcia Marquez? O meu eleito é O Amor em Tempos de Cólera. 
Mas muito mais há para descobrir nos seus autores, ainda que a recente história de luta de cartéis da droga e guerrilha urbana seja um tema quase comum e transversal nas obras dos últimos anos. Algumas sugestões são Hector Abad Faciolince (Somos o Esquecimento do que Seremos), Juan Gabriel Vasquez (O Barulho das Coisas Ao Cair) e o essencial Delírio, de Laura Restrepo.



Quanto a cinema, a ideia que fica é a de que o realismo mágico não está presente apenas na literatura. O filme a Estratégia do Caracol (1993) é um bom exemplo da imaginação sem limites dos colombianos. Depois temos uma vez mais a presença do negócio da droga no filme Maria Cheia de Graça (2004). E para algo totalmente diferente O Abraço da Serpente (2015), retrato das relações do homem branco cientista com um xaman de uma tribo da Amazônia profunda.
E fica a faltar a música para embalar a viagem. Eis uma playlist com os incontornáveis Shakira e Juanes, sim, mas com notas bem para além deles.

sexta-feira, julho 08, 2016

Piodão - Foz de Égua - Piodão

Este percurso circular tem cerca de 7 km. 


Bem sinalizado no Piodão através de placas, subimos até ao cemitério para iniciar o percurso que nos levará a Foz de Égua. O caminho é fácil fisicamente e gratificante visualmente. Rapidamente nos sentimos esmagadas pela paisagem da Serra do Açor, montes com vegetação a envolverem-nos no vale. 




Do lado contrário onde seguimos caminho - e aquele por onde retornaremos - vamos vendo desfilar pela encosta uma série de casas em xisto abandonadas. Perguntamo-nos se alguém alguma vez terá vivido naquele isolamento ainda maior, ou se apenas foram em tempos casas de arrumos de material ou de animais. 




Os socalcos marcam presença e observando bem conseguimos destrinçar neles casas em fila. 
Lá bem em baixo segue o rio.









Apesar da alegre caminhada, saudamos a chegada ao lugar de Foz de Égua. Uma vez mais, casas em xisto debruçadas na paisagem. E uma praia fluvial para refrescar. Sobre as ribeiras do Piodão e de Chãs de Égua temos uma ponte de madeira em U que balança sem parar e parece poder ceder a qualquer momento. Não me aventuro a atravessá-la e faz-me impressão só de ver tremelicar nos ares quem o faz. 
O momento kitsch do passeio acontece num plano mais elevado na paisagem, onde foram construídas umas indescritíveis capelas.







Adiante que é hora de regressar.



Seguindo pela outra margem do rio, o percurso é menos frequentado e menos fácil. Mas só o seu início, pois há que subir a bom subir por terreno pedregoso e algo instável. Depois de seguir um pouco pelo asfalto voltamos ao caminho e ficamos com os socalcos mesmo à mão de semear. Ainda se vêem pessoas a trabalhar a terra. Grande parte do caminho é percorrido junto a uma levada e em todo o percurso o som da água é uma companhia constante e amiga, embora mais profunda nesta parte. 



Passamos mais uma pequena ponte com um fiozinho de água a correr nas paredes que lhe protegem as costas e logo começamos a sentir o anfiteatro do Piodão mesmo à nossa frente. Deve haver poucos lugares melhores do que este para se ficar face a face com o maior conjunto de casas de xisto e telhado de lousa. Ainda para mais, pronto a ser contemplado em plena solitude, como manda a tradição.


terça-feira, julho 05, 2016

segunda-feira, julho 04, 2016

Piodão

O Piodão costuma carregar consigo todos os clichês que se podem imaginar. Desde o "aldeia mais típica de Portugal" ao "aldeia presépio", tudo serve para a adjectivar. Até o Huffington Post se lhe referiu o ano passado como a "adorável aldeia portuguesa que parece saída dos Flinstones".
Não estamos na idade da pedra, mas é uma pedra / rocha que faz a fama da aldeia do Piodão.
O xisto é o rei por estas terras e o Piodão é apenas o lugar onde ele está mais concentrado como material utilizado para os edifícios - casas, sim, mas também pontes, degraus e caminhos.



Pese embora os clichês, é uma realidade a delícia que é confundirmos desde longe o casario instalado numa parede do vale, como se de socalcos se tratasse, mais parecendo casinhas de brincar, e irmo-nos aproximando e distinguindo cada vez melhor esse casario da terra onde está instalado. 




As portas e janelas carregadas de tinta azul viva ajudam a quebrar a monotonia monocromática deste pedaço da Serra do Açor. Com efeito, desde a integração do Piodão no projecto das Aldeias Históricas de Portugal, todas as casas em cimento e telhados de telha têm vindo progressivamente a ser convertidas em casas de paredes de xisto e telhados de lousa, no sentido de recuperarem os materiais tradicionalmente utilizados na região.
Resultado? As casas agora bem restauradas e conservadas são um mimo. 


Apenas a igreja alvíssima destoa da paisagem, ainda que no bom sentido, adornando-a ainda mais. 
Diz-se que foi mandada construir por um padre vindo do Alentejo, tendo aqui replicado as cores brancas da sua terra.

(no mau sentido, ou pelo menos num sentido estranho, as antenas brancas da Meo e da Nós marcam também hoje a paisagem de uma forma intensa)



As pequenas ruas da aldeia não são fáceis de percorrer, quer pelo seu piso sinuoso quer pelo seu declive acentuado. Todavia, tal só lhe confere ainda mais carácter e valoriza a experiência de se percorrer um povoado característico.


O Piodão foi desde sempre uma região muito isolada. Diz-se que os criminosos fugiam para lá e que sentiam estar no "pior do mundo" - o "piodam" entretanto transformado com o tempo em Piodão. Historicamente não se sabe com certeza quando começou a sua habitação. Como havia já referido a propósito de um post sobre Aldeia das Dez (a cuja freguesia o Piodão chegou a pertencer), um recenseamento joanino de 1527 informava ter o Piodão nessa época dois habitantes. Talvez pastores de rebanhos. Ou certamente dedicados à agricultura. Estas duas actividades são ainda nos nossos dias as predominantes entre os habitantes da aldeia, sendo visível o cultivo de algumas (poucas) terras na sua envolvente.



Hoje parte do concelho de Arganil, o Piodão é a zona mais turística da região. Pequena como é, não é fácil dividir o espaço com os outros enquanto caminhamos pelas suas ruas estreitas e num dia de calor deve mesmo ser impossível compartilhar a sua praia fluvial com os magotes de visitantes. Impossível, igualmente, evitar as muitas bancas com artesanato e produtos gastronómicos locais. 
O isolamento acabou.

sexta-feira, julho 01, 2016

Avô


Avô, tal como Aldeia das Dez, é uma freguesia do concelho de Oliveira do Hospital. E como Aldeia das Dez, também, tem um topónimo curioso. A palavra "avô" derivou aqui da palavra "vau", cujo significado é baixio, lugar do rio onde se pode passar a pé. E era precisamente isso que se conseguia fazer em tempos remotos nesta que costuma ser considerada "uma das aldeias mais bonitas de Portugal". A Ribeira de Pomares (rio Moura) possuía um caudal fraco e era por ela que se entrava na povoação. Esta ribeira junta-se ao rio Alva e os dois formam uma deliciosa praia fluvial que mais parece um lago. Melhor. A sua união deixou que se formasse uma ilha no meio, a ilha do Picoto.


Era para aqui que vínhamos dar um mergulho no rio quando éramos pequeninas e os pais estavam connosco na Beira. A mãe até hoje não se cansa de lembrar que foi ali, naquele género de areia à beira do rio, que tirou a fotografia em que estamos enroladinhas na toalha. A água era fria, mas isso nunca fez diferença. Como é mais distante do que a Ponte das Três Entradas desde Aldeia das Dez, para Avô vínhamos também sobretudo aos fins-de-semana com os primos. Olhando hoje o minúsculo ringue que fica na ilha até custa a acreditar que algum adulto lá pudesse jogar à bola, mas é disso que me lembro. Disso e de se comer os meus detestados peixes do rio. Nisso continua tudo igual.


Avô é, pois, o rio e, claro, a sua ponte. A ponte é muito alta mas pouco comprida. Ainda recordo os rapazes a saltar lá de cima, o que parece impossível hoje, tão juntas estão as pedras lá no fundo da água claríssima.



A entrada em Avô para quem vem das Vendas de Galizes tem início uns quilómetros antes de se chegar efectivamente à povoação. Antes de começarmos a descer, há que parar nas Varandas e perceber Avô e toda a sua envolvente. Aqui deparamo-nos com os primeiros dos muitos versos que iremos ler em toda a vizinhança. Avô é terra de poetas e um dos seus maiores, Doutor Vasco Campos, partilha connosco:

"D'estas varandas se alcança 
A Serra montes a fio...
E lá no fundo Avô, 
Velhinha sempre criança 
A espelhar o seu brio
Nas águas mansas de um rio 
Onde o meu sonho ficou."

Avô é a sua ponte, o seu castelo e a sua igreja. 
Já tínhamos pensado nisso, mas outro poeta, já não nosso contemporâneo, Brás Garcia Mascarenhas, confirma-nos:

"Os bosques, em que está, vê deleitosos
A ceres loura, e a flora jardineira;
Vê nascer entre os rios caudalosos
Nobre vila em península guerreira,
Que com três edifícios sumptuosos,
Ponte, castelo, igreja. Honrando a beira
Enobrece Diniz, segundo brigo, 
Novo restaurador do reino antigo."

A história de Avô é remota e teve início antes mesmo dos romanos aí se estabelecerem e aí fazerem passar a Via Imperial. Os romanos, esses, terão sido atraídos pelo ouro e chumbo que existiam nas margens do rio Alva. No século VIII vieram os muçulmanos e no século XI os cristãos. Avô foi couto de D. Afonso Henriques antes mesmo da criação do Reino de Portugal e sobre umas ruínas romanas o nosso primeiro rei aqui mandou edificar o castelo de que hoje sobram ruínas e uma muito bem perceptível muralha. Altaneiro, daqui se obtém uma vista bem bonita para o verde da paisagem e os telhados ocres do casario. 




O caminho até ao castelo faz-se subindo por ruas estreitas e cheias de cotovelos que não escondem o traçado medieval da povoação. O edificado está não só bem conservado como bem cuidado. Esta também é uma aldeia das flores.




De volta à parte baixa de Avô, deparamo-nos com os antigos Paços do Concelho. Praça bonita, uma vez mais bem cuidada, lembra-nos que Avô foi sede de concelho até ao século XIX, quando passou a estar integrada no concelho de Oliveira do Hospital.


Restam algumas capelas antigas pitorescas por Avô. Para além da Capela de São Miguel, à entrada do Castelo, destaque para a Capela de Santa Quitéria, um pouco escondida à entrada da ponte sobre o Alva. Do outro lado da estrada fica a igreja matriz de Avô datada do século XVI, embora tenha sido posteriormente reedificada, e à qual foi construída no lugar em que D. Afonso Henriques havia fundado uma igreja.


História, beleza e lazer, é o que Avô nos tem para oferecer.