Ir à Madeira e não sair do Funchal ou, sequer, de um dos seus hotéis é passar ao lado daquilo a que facilmente chamamos viagem de sonho quando pensamos em paisagens deslumbrantes e irreais.
Não que de vez em quando não mereçamos apenas descansar, relaxando entre um banho na piscina, uma esticada numa espreguiçadeira sob um sol ameno e um mergulho no mar de água calma e morna deste Atlântico. Mas perder a beleza natural e por vezes imaculada que a Ilha nos tem para oferecer para além do cenário de presépio acesso durante a noite da sua capital é imperdoável.
Comecemos, todavia, pelo Funchal e seus hotéis.
Foi neste último ponto que surgiu uma das raras desavenças com que as manas se deparam em viagem. Eu gostaria de ficar alojada numa das Quintas http://www.quintas-madeira.com/madeira/quintas/default.asp?Site_Lang=pt de que o Funchal dispõe para quem gosta de se manter um pouco à margem do turismo de massas, num ambiente único e por vezes exclusivo, mas sempre confortável e dispondo de todas as facilidades e mimos de que se gosta de não prescindir quando estamos fora de casa (e que adoraríamos ter ao longo do ano de trabalho). Já tinha até o poiso escolhido – a Quinta da Casa Branca, prémio de arquitectura do Funchal em 1999. A questão que se colocava era: valeria a pena gastar $ e mais $ em algo que só nos serviria para passar a noite? A racionalidade ganhou e o sonho ficou adiado para, quem sabe, quando for velhota e escolher o Funchal, a piscina e a espreguiçadeira em exclusividade para a uma futura viagem à Madeira. Assim, ficámo-nos pelo Hotel Vila Ramos, ali bem perto, mas desde a sua varanda tivemos direito a uma vista do nascer do sol junto à Ponta do Garajau de deixar qualquer um logo bem disposto pela manhãzinha.
Voltando às quintas, se algumas destas foram aproveitadas, ou melhor, transformadas em hotéis, outras há que se mantém ainda como espaços públicos, acompanhadas do respectivo jardim.
Curiosamente, a primeira Quinta / Jardim que nos calhou em sorte visitar logo após ter-mos deixado as malinhas no hotel foi a Quinta da Magnólia, bem perto do Estádio dos Barreiros. E digo curiosamente porque foi, uma vez mais, voltar a um local onde já havíamos estado há uns quantos anos e que se encontrava bem presente na memória. No fim da década de 80 a Quinta da Magnólia recebeu o Meeting do Funchal de Natação e a piscina de 25 metros sem linhas direitas tinha que ser adaptada para o efeito. Inesquecível a bancada que montaram num estreito topo da piscina e que, graças às tais linhas que não eram (são) direitas permitia que passássemos por baixo dela a nadar e por lá ficássemos num cantinho exíguo com o público por cima de nós. Para além da piscina, que parece ter os dias contados por força de uma futura e já prevista remodelação na Quinta, temos ainda o seu edifício principal, onde está hoje instalada a Protecção Civil, uns courts de ténis e um jardim amplo e acolhedor com árvores centenárias. É aqui que costuma decorrer o Funchal Jazz.
Que a Madeira é um Jardim já toda a gente o sabe. Que o Funchal possui uma mão cheia deles, bem cuidados e refrescantes, cheios de plantas e flores lindíssimas, daquelas que costumamos associar à ilha, isso ficamos todos nós a saber após uma breve caminhada pela cidade. Breve mas não fácil, uma vez que as inúmeras e insistentes ladeiras teimam em nos deixar ofegantes.
Precisamente após uma boa caminhada sempre a subir iniciada junto à Câmara Municipal do Funchal (numa praça bonita e interessante, ou não estivessem aí instalados também o Museu de Arte Sacra e a Igreja do Colégio dos Jesuítas) e passando a loja da Fátima Lopes e a Igreja de São Pedro, chegamos à Casa Museu Frederico de Freitas. A Casa Museu é paga mas o acesso ao seu pequeno jardim (bem como às exposições temporárias) é livre. A não perder este recanto de bom gosto.
Continuando a nossa subida, uma breve paragem para abrigo da chuvada, que entretanto caiu, na Casa de Chá do Museu Universos de Memórias, cujo espólio adquirido durante as suas viagens pelo mundo fora foi doado por João Carlos Abreu, o eterno Secretário Regional do Turismo e Cultura (extra! extra! ex-secretário regional, uma vez que em consequência das recentes eleições na ilha, parece que finalmente este “dinossauro” do governo regional saiu da cena governativa).
Um pouco mais acima, mas do lado contrário, a Quinta das Cruzes aguarda pela nossa visita. Há quem defenda que aqui moraram João Gonçalves Zarco e os seus sucessores Capitães Donatários, mas o certo é que na década de 50 do século passado a sua casa foi adaptada para museu, expondo artes decorativas, e o acesso ao seu jardim –livre – devia constar do manual obrigatório de todo aquele que se dirige à ilha. Aqui existe uma vasta e diversificada presença de plantas endémicas, algumas delas exuberantes, incluindo um grande número de orquídeas. Para além disso, no meio do jardim deparamo-nos com umas janelas manuelinas e outras esculturas arqueológicas.
Como não nos tinha bastado toda esta subida e não tínhamos arfado o suficiente, fomos mais além, até à Fortaleza do Pico onde se obtém um visual esmagador da cidade do Funchal.
Bem mais acima, mas do lado contrário da cidade, outro visual a não perder – o do Monte, a cerca de 550 m. Segundo o Wikipedia, o Monte foi considerado pela Revista Forbes de Maio de 1978 como a mais bonita freguesia do mundo. Seja ou não correcta esta informação, certo é que o Monte é também conhecido como a Sintra da Madeira.
A forma mais pitoresca de aqui chegarmos é através do teleférico que sai cá debaixo, desde a cidade velha, oferecendo-nos vistas fantásticas de toda a cidade. E, claro, a forma mais provável e turística de dali sairmos é descendo pelos carrinhos de cesto, guiados por 2 profissionais carreiros empoleirados nas traseiras do “veículo”, num percurso de cerca de 2 km. Sempre adiada nas anteriores passagens pela ilha, esta revelou-se uma boa experiência, com a descoberta do Atlântico sempre ao virar de cada curva e ao fundo das intermináveis ladeiras. Actualmente, para fazer face à canseira dos carreiros, a viagem acaba no Livramento, o que corresponde a cerca de metade do que era realizado anteriormente até ao centro do Funchal. Depois é só continuar a descer pelas nossas perninhas novamente até junto ao mar.
Voltando, no entanto, um pouco atrás, o Monte é dos locais mais aprazíveis para se viver e visitar. Confirmando o afirmado, quintas, mansões e turistas é o que não falta por aqui.
A Igreja de Nossa Senhora do Monte é, provavelmente, o postal mais conhecido desta zona, com o seu edifício branco e a escadaria cinzenta a contrastar com o abundante verde que a circunda e o azul do céu (quando não está nublado) e do mar.
Voltando aos jardins, no Monte ficam outros dois sempre destacados em qualquer reportagem mas que não visitamos: os Jardins do Imperador (Carlos da Áustria, que aqui residiu e faleceu) e o Jardim Tropical Monte Palace (do “mecenas” Joe Berardo, que fez questão de “oferecer” aos seus conterrâneos uma colecção de plantas dos 4 cantos do mundo, incluindo uns estranhos pagodes).
Concluindo esta breve tour pelo Funchal, vale a pena ainda uma visita a outros 3 símbolos da cidade: o Jardim Botânico, que por falta de tempo não visitamos, não sem lamentos; o Parque de Santa Catarina, talvez o mais popular e acessível; e o Mercado dos Lavradores – este último merece obrigatoriamente uma parada. O seu edifício da época do Estado Novo, em Art Déco, com painéis de azulejos na entrada, é comparável ao interesse que o movimento do seu interior nos mostra. A azáfama dos comerciantes de peixe, legumes, fruta, bordados, flores, objectos em vime, caramelos de funcho e todos os demais produtos típicos da ilha servirá para accionarmos todos os nossos sentidos e daqui escolhermos uma recordação para alguém que gostaríamos que tivesse a mesma oportunidade de viver toda esta alegria e colorido.