Kamikochi, a meia hora de Hirayu, fica no vale do rio Azusa, a 1500 metros de altitude, e daqui avistam-se bem perto montanhas cujos picos passam dos 3000 metros. Para se chegar aqui só de autocarro ou táxi, carro particular não entra nem se aproxima. Isto entre Abril e Novembro, porque no resto do ano não há nada para ninguém, tal deve ser o congelamento.
Daqui partem uma série
de trilhos, incluindo escaladas às
montanhas - que não
fizemos. Optámos
por umas belas caminhadas, sempre planas, fáceis,
ideais para dedicarmos toda a nossa atenção
à beleza que
nos rodeia. E o que nos rodeia, já
se sabe, são
vales, montanhas e muita vegetação,
mas também
rios e lagos a cada passo. E vulcões.
E pontes pitorescas, daquelas que mesmo aparentando firmeza balançam à nossa passagem. E
uma fauna e flora que merecem também
atenção. Aliás, o barulho
intenso dos pássaros
é impossível de ser
ignorado. Mas não
aborrece, antes torna a comunhão
com a natureza mais perfeita ainda. No caminho podemos encontrar macacos - e
constatar com pavor como eles são
mesmo iguais a nós
- e ursos. Felizmente destes últimos
só tivemos notícia pelos avisos
espalhados pelo parque de que haviam aparecido no dia anterior e como proceder
caso avistássemos
um deles. Não
fazer barulho, não
correr. O que vale é que
existem árvores
bem altas ali à mão para podermos
subir e escondermo-nos. Não
foi preciso.
Começámos
por ter sorte com o tempo bom, terminámos
com dificuldade em observar o postal na sua plenitude. Maldita chuva, inimiga
do viajante. Mas o balanço
foi entusiasmante. Este dia calhou a um domingo e pudemos comprovar a união que liga os
japoneses à natureza.
Não sei donde
vieram, uma vez que não
haverá muitas
povoações ali
mesmo perto, mas eles eram aos magotes, sozinhos ou acompanhados, em par ou em família, de tal forma
que nos fartámos
de gastar o nosso konichiha(wa) de tanto nos cruzarmos com os simpáticos japonocas
caminhantes.
Kamikochi foi dada a conhecer pelo tal missionário ocidental que
terá cunhado a
expressão
Alpes Japoneses. Mas Ryunosuke Akutagawa, o autor de Rashomon (que Kurosawa
filmou), também
contribuiu para a sua divulgação
com a sua novela "Kappa", nome da ponte balançante que é actriz principal na paisagem de
Kamikochi.
E já que
falamos de escritores japoneses, de volta ao onsen de Hirayu lembrei-me de
Kawabata e da sua obra "Terra de Neve". Não tinha nenhuma geisha, nem o
desejava, para me acompanhar. Também
não tinha a
neve a marcar a paisagem. Mas, ainda assim, senti que vivia parte do que é ser japonês, estar em
contacto com a natureza e emergir num ritual que não sendo só seu é
aqui observado com todo o requinte que só
os japoneses parecem ser capazes de lhe conferir.